30 de janeiro de 2009

Insônia

Esta sombra que me esconde
É a noite que me come
E some dentro de mim

Esta lua que me acorda
É corda que me enforca
É força que me força
Àbrir os olhos no escuro

Este muro que me cerca
Esta vara que me pesca
- para fora do sonho

É o sono que me escapa
É o eclipse da mente
E o despertar da alma.

22 de janeiro de 2009

Se o silêncio falasse,

seria como um sopro atônito de desabafo.
Um som sincopado disposto entre códigos e ecos, uma mistura de todas as mágoas antes abarcadas e absorvidas. Ele choraria a morte de todos aqueles que imploraram pela vida, naquele ultimo momento, quando a voz está cava e trêmula demais para ser ouvida, quando parece que há um bolo na garganta impedindo que o ar siga o seu fluxo inato.
Ele choraria a desilusão de todos os amores perdidos, que, mudos, foram se perdendo no tempo, entre os vilões da mentira e do egoísmo, que estão sempre a sussurrar ao ouvido dos mais fracos. Sussurros, embora baixos, são ouvidos; enquanto o silêncio, que não tem voz nem nada, resigna-se em apenas tocar nas almas, como dedos de seda resvalando pelo espírito. Alguns sentem o arrepio e entendem... outros, porém, colocam a culpa no vento que, às vezes, ressoa como trombetas para que o silêncio se sufoque no vazio da própria impessoalidade.
Ah, não deve ser fácil ser sempre impessoal e imparcial... ter que ficar sempre quieto e calado, como uma parede sem olhos nem ouvidos. Também não deve ser fácil ouvir os lamentos de todos sem nunca se queixar, sem nunca se lamentar também...
E se o silêncio já houver se apaixonado? Deve nos invejar, quando nos ouve declamar um poema, confessar uma paixão, cantar aquela musiqueta chata que, embora seja mesmo chata, nos lembra daquele velho amor de verão.
Se nos sentimos sozinhos, abraçamos o silêncio. Se estamos com medo, o acusamos de fúnebre. Se o barulho nos incomoda, clamamos por ele. E quando ele vem, o chamamos solidão...
Se o silêncio falasse, eu o ouviria quietinha, até que ele se cansasse e adormecesse em meus braços, assim como eu (tantas vezes) o fiz.

20 de janeiro de 2009

Bem-me-quer?

As pétalas se desprendem,
caem
o vento leva embora.
Embora em flora, descolora.
Voam
o vento trás o canto
do pranto de quem chora
agora.

papo de surdo e mudo.


Wish you were here.

16 de janeiro de 2009

Chicobuarcando

Alô, liberdade, desculpa eu vir assim sem avisar, é que eu estava à toa na vida de um sonhador titã, e seus olhos me chuparam feito um zoom. Pede pro tempo marcar seus caminhos, que os galos estão cansados de cantar! Um tempo que refaz o que desfez, recolhe todo o sentimento, e bota no corpo uma outra vez. Sim, vai e diz que o meu desalento já não tem mais fim; mais que na lua ou no comenta, eu entrego os pontos com o sangue impresso na gazeta. Diz que eu estive por pouco, diz que eu estou ficando louco! Os diamantes rolam no chão, o ouro é poeira, a fonte nunca mais que seca, e aquele poço não tem fundo, é um mundo, dentro um mundo. Palmas pra ala dos barões famintos, o bloco dos napoleões retintos e os pigmeus do bulevar. Meu Deus, vem olhar a evolução da liberdade! Uma pirueta, duas piruetas. Bravo! Bravo! Todos juntos somos fortes, somos flecha e somos arco. Mas mesmo calada a boca, resta o peito, e eu quero inventar o meu próprio pecado, quero morrer do meu próprio veneno, e tropeçar no céu como se fosse um bêbado.
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15 de janeiro de 2009

ei você,

esse papo de "não quero falar" não cola mais, nem esse seu jeitinho esquisito de dizer não dizendo sim. Do que você tem medo afinal? De se entregar a uma dança até seus pés se encherem de calos? De deixar seus cabelos emaranhados com o vento? ou que sua maquiagem escorra? Eu tenho um conselho. Saia detrás dessa sua máscara, toda essa base que você usa está te deixando branca demais. e você já reparou em quantas pessoas se deitam sob o sol para pegarem uma cor? fiz isso há pouco tempo, fiquei vermelha e ardida, mas continuo sendo a branquela do papai. sabe o que isso significa? as mascaras sempre caem, e algumas nem mesmo duram tempos o bastante para serem acreditadas. Em outras, só você acredita. Ou apenas quer acreditar? Dane-se. São apenas sacrifícios vãos que as pessoas vazias fazem para se sentirem mais preenchidas. Mas sabe o que mais? Não seja vazia. Sorria mais, perdoe mais, cante mais, sinta o cheiro da chuva mais vezes, e de repente você vais e sentir cheia de amor. Amor para dar. Amor que lhe foi dado. Porque as pessoas gostam de amar! Amam artistas, canções, animais de estimação e até mesmo dia das semanas. Porque não amariam você? Não precisa mudar. Procure o que há de bonito em você, mas não esconda o que há de feio com base. Não amenize as verdades com mentiras. Não deixe de sonhar para não acordar. Não deixe de se apaixonar pra não sofrer. Não deixe de andar de avião pra não cair. Voe alto, minha querida.

Apenas mais uma de amor.

Era uma sala pequena, mas a tintura branquíssima emprestava ao âmbito uma amplidão e uma placidez que não condiziam ao local. Quanto desespero já não se passara entre as paredes daquele hospital? Perguntava-se uma jovenzinha pálida de cabelos extremamente vermelhos, cujas pequeninas mãos repousavam sobre um livro de capa grossa e chamativa. Era um romance épico. Anastácia sorria para si mesma, imaginando em como os sentimentos eram intensos naquele tempo — ou pelo menos em como os artistas acreditavam nisso. Acreditar é o primeiro passo para conquistar, dizia ela ao seu irmão mais velho, quando ele demonstrava laivos de desapontamento para com a vida. Mas não era verdade? As pessoas morriam por amor, porque acreditavam em sua força. Agora, entretanto, morriam apenas por desastres, acidentes, homicídios ou mesmo suicídios. Tão triste, pensava ela. O sorriso em seu gosto parecia que ia se esvaindo aos poucos, enquanto os olhos dela se embebiam da agonia daquelas pessoas que, estando numa mesma sala, sequer pensavam em compartilhar sua dor uns com os outros. Todos fechados em seus casulos, ocupados demais com suas próprias amarguras.
Anastácia relanceou os olhos, e suas íris esmeralda recaíram novamente sobre o livro. Abriu-o. Folheou-o. Naquelas palavras encontrava o alento que a realidade não oferecia. E que seus pés, impossibilitados de se moverem, não podiam partir em busca.
Somente quando o som de ranger da porta se propagou pelas paredes da sala, Anastácia retornou a realidade. Esboçava um sorriso sereno nos lábios, um ar de quem desperta de um sonho bom e faz uma prece silenciosa para que seja verdade.
Estivera em Roma, na Era em que homens enfrentavam leões para provarem seu amor. E Havia um rapaz: Benjamim Lourenço, o nome dele. Integrava o exercito de Marco Aurélio, um dos melhores cavaleiros, e acabara de regressar de uma guerra sangrenta contra os Germanos.
Agora ele estava indo de encontro à sua secreta e amada Juliett, filha do imperador. Uma paixão proibida, certamente. Mas quando há amor verdadeiro, uma faísca transforma-se em fogaréu intenso num conciso piscar de olhos; e quando menos se espera, já não se ouve mais a voz da razão ou do bom senso, apenas as batidas violentas de um coração aflito de tanta saudade.
Ele cruzou, em passos céleres, a grande multidão que festejava a volta vitoriosa dos cavaleiros de Roma. Havia uma imensa profusão de danças e bebidas; as mulheres felizes por seus maridos terem voltado em paz da guerra. Das que os haviam perdido, entretanto, pouco se lembrava. Mesmo naquele tempo, a alegria da maioria já ofuscava a tristeza dos poucos; dos parcos e opacos eremitas.
Quando Benjamim transpôs os portões, estava a sorrir. Era um homem jovem e bonito, de tez trigueira, olhos negros como a noite que os acobertava quando fugiam para verem, juntos, a lua se posicionar no ponto mais alto do céu. Grande céu. Sendo ele (o céu) tão extenso, como as estrelas não se perdem? Indagava Juliett a si mesma, debruçada na janela, a esperar seu amado e amante, seu guerreiro e herói, ou, somente, seu querido Ben.
Ela olhou-o se aproximar pelos jardins. E como eram lindos os jardins! Flores de todas as qualidades e cores; rosas, heliotrópios, lírios grandes e pequenos. Uma imensidão verdejante circundando o palácio colossal, erguido em mármore, coberto de hera.
Benjamim se aproximou mais dos muros do palácio. Era o momento em que Juliett — enrolando os cabelos nas pontas dos dedos — sorri-lo-ia com suas feições de anjo, e confessaria ter orado todas as noites por sua volta. Anastácia sabia porque já lera aquele mesmo livro outras nove vezes (não possuía dinheiro para novos); em cada uma delas, imaginava novos detalhes no cenário, nas expressões, nas palavras... Era como se pudesse mergulhar mais profundamente nas páginas, se as folheasse o bastante. Mas, naquele momento, parara de folhear. O ranger da porta parecia ter se introduzido no curso da história, sobrepujando todos os outros sons.
Anastácia fechou o livro, acariciando delicadamente a capa, e meneou a cabeça na direção da porta.
Foi imediata, sua reação. Seus olhinhos verdes se estreitaram um pouco, ela pestanejou descrente. O insubstancial cheiro de flores que ainda respirava fora substituído por um cheiro amargo e agressivo de óleo dísel. Mas em despeito à drástica mudança de aromas, ela sorveu longos haustos de ar: era bom. Era como se sentisse o cheiro peculiar dos cavalos de Benjamim, aquela mistura entre suor e pólvora que era estranhamente entopercente, como um vício que não se quer largar. A surpresa maior veio em seguida, entretanto. Um homem fora o causador do ranger, ele adentrou a sala de espera apoiando-se das paredes. A camisa dele estava manchada de sangue na altura do ombro, e as mãos pareciam trêmulas e sem força. Quando Anastácia fitou-lhe o rosto pálido (de quem perdera muito sangue), sobressaltou-se. Aqueles olhos, tão escuros e profundos que mais pareciam buracos negros, eram embaraçosamente familiares, a pele morena, naturalmente bronzeada e castigada pelo sol; tudo e cada mínimo detalhe era igualmente belo e hipnotizante, como Benjamim na história.
Anastácia, por curiosidade ou preocupação, deteve-se naquela figura por alguns instantes. Criara um homem no recôndito dos seus pensamentos e agora ele estava ali, à sua frente, cambaleando para junto de si.
Quis ajudá-lo, mas não havia nada que pudesse fazer. Amaldiçoou seus pés inválidos por não poderem levá-la a ele, por privarem-na na honra de apoiá-lo em um dos seus ombros.
— Benjamim! — clamou angustiada, ao vê-lo desabar ao chão, quase tocando seus (amaldiçoados) pés. — Ajudem-no, por favor! — implorou a ninguém em especial.
Mas todos ainda pareciam demasiadamente alheados à realidade para se moverem. Apenas um senhor, já meio encurvado pela idade, ousou se manifestar. Ajoelhou-se diante do homem caído e ergueu-o o máximo que pôde. Um rapaz bem moço também se levantou depois, e, um minuto mais tarde, já havia cinco novas pessoas a ajudar. Postaram o misterioso numa cadeira ao lado de Anastácia. Ela mostrou-lhe os dentes brancos, tocando-lhe suavemente a tez grosseira do rosto dele.
— Do que você me chamou? — a voz dele parecia gorgolejar, quando falava. E ele soltou um suspiro, como se estivesse muito, muito cansando; como se somente falar custasse-lhe um esforço enorme.
— Benjamim.
— É esse o nome que você dá a estranhos? — com os olhos fechados, ele retorceu os lábios num sorriso cheio de dor.
— Não, esse nome é especialmente seu, estranho. Mas agora fique quieto, precisa poupar suas forças. Você levou um tiro? — ao perceber que sua pergunta exigiria dele uma resposta, acrescentou: — ora que tola eu sou, não responda, apenas descanse.
“Benjamim” deve ter achado graça na forma como Anastácia se repreendia, mas não pode sorrir. Engasgou e começou a tossir sangue. Parecia que seus ossos chacoalhavam dentro dele, cada vez que seus pulmões expeliam rajadas de hemorragia interna.
— Por favor, continue falando comigo. — ele implorou com suas últimas forças, e seus olhos se fecharam novamente. Estava mesmo muito, muito cansado.
— Sim, claro. — e se pôs a contá-lo sobre Roma, sobre os cavaleiros destemidos e os leões. Contou-o sobre Benjamim e Juliett, sobre como o amor deles resistira até mesmo a repressão imperial e sobre como os finais felizes deveriam ser reais.
Se ele ouvia, não demonstrava qualquer traço de atenção. Mas ela continuou a falar.

12 de janeiro de 2009

Avante, errante!

Eu não sou, estou. Estou vivendo da forma mais errada que posso. Passo a madrugada acordada, durmo durante o dia. Digo o que não devo dizer, me faço de surda quando não quero ouvir. Ignoro quando me criticam, me empertigo quando me elogiam. Tenho medo do que não conheço, mas não conheço quase nada. Às vezes quebro promessas, às vezes prometo o que não posso cumprir. Sorrio quando estou triste, choro quando devia sorrir. Brigo quando estou de mau humor, fico de mau humor quando durmo pouco, durmo pouco quando tenho insônia, tenho insônia quando estou confusa, fico confusa quando tento me entender, tento me entender quando não entendo mais nada, não entendo nada quando deixo tudo para o ultimo momento, deixo tudo para o ultimo momento quando começo a hesitar, hesito quando não tenho certeza e não tenho certeza de nada que envolve sentimentos, acordes e números. Entretanto, dou tiros certos em alguns corações, canto alto algumas canções, e resolvo muitas equações. Estou vivendo da forma mais errada que posso porque, em meio a tantos erros, hei de um dia acertar.

Clara mente

– O que é esse tal de sol?
– É a lâmpada do mundo.
– E o amor?
– A energia elétrica.


Ah se você soubesse...
Sou aquele abajur empoeirado na sua estante, que cria mais sombra que ilumina.
Mas quem se importa? Você tem luz pra nós dois.
Deve ser incandescente. Sem duvidas, é quente.
E eu sou só fluorescente. Brilho no escuro, quando não tem mais ninguém pra se ver.
Seria invisível, se não fosse você.

(...)

Acho que você sabe, sou como a lua refletindo a cor do seu sol.
Mas quando você se distrai... Ah, eu te pesco com meu anzol!

Quem me segue (se perde comigo)